O Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP, sob a coordenação do Ministro Gilmar Mendes, organizou o Ciclo de Conferências Paulo Brossard – Reforma Política e Democracia.
Com apoio do CONJUR e do Instituto Pimenta Bueno, um dos debates tratou da “Crise do Presidencialismo e Reforma da Governança”, com a exposição inicial do Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que me deu as primeiras aulas de Direito Constitucional na Faculdade de Direito do Largo São Francisco.
Segundo o Professor Manoel Gonçalves, a suposta estabilidade do presidencialismo passou a ser um entrave para a superação de crises, as quais passaram a ser, no Brasil, a “normalidade” desse sistema de governo.
Lembrando Afonso Arinos, para quem a disputa de duas candidaturas à Presidência seria “um plebiscito entre dois demagogos”, Manoel Gonçalves avalia os pros e contras de cada regime.
Gonçalves registra também que houve enorme ampliação das competências do Executivo, passando hoje, além das atribuições clássicas, pela regulação da economia e promoção do bem estar social.
A vida partidária se tornou uma ficção, pois o multipartidarismo, ancorado na representação proporcional sem cláusula de barreira, não permite a existência de identidade doutrinária e ideológica. Os partidos passam a ser “meras máquinas para a disputa das eleições”, com “conteúdos amoldados pelos marqueteiros”.
Para o professor Gonçalves, o mérito do parlamentarismo é a cooperação entre o Legislativo e o Executivo. Mas o Gabinete depende da maioria parlamentar.
Com a existência de muitos partidos (hoje são trinta), deixa de haver estabilidade.
Relembrando o modelo híbrido adotado pela França em 1958, que teria inspirado a Constituição Portuguesa de 1976, hoje em vigor, o professor das Arcadas diz que “a fórmula mista visa, em síntese, combinar a flexibilidade e a concertação da governança, que propicia, naturalmente, o sistema parlamentar, corrigindo a sua instabilidade pelo elemento de estabilidade presente no sistema presidencialista”.
No entanto, o Professor Gonçalves assinalou que há de se reconhecer que há uma forte herança cultural pelo presidencialismo, o que acaba por valorizar a figura personalizada do Presidente da República, com um viés historicamente autoritário.
“Parlamentarismo e Presidencialismo tem qualidades e defeitos…De fato, uma terceira via pode talvez superar a desgastada e batida alternância entre presidencialismo e parlamentarismo”, enfatizou o professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho.
O ex-Advogado Geral da União, José Levi do Amaral, ao fazer um retrospecto histórico sobre o instituto da reeleição no presidencialismo, lembrou que o modelo parlamentarista adotado no Segundo Império trouxe certa estabilidade, ressalvando as características próprias da época. Em sua intervenção, Levi do Amaral faz uma interessante abordagem sobre Borges de Medeiros e a figura da reeleição no Estado do Rio Grande do Sul. Levi também discorreu sobre o cientista político francês Maurice Duverger e sua clássica obra Os Partidos Políticos, na qual se discute o papel dos partidos na
governança política.
O Ministro Gilmar Mendes tem refletido, sobretudo nos últimos tempos, acerca das possibilidades de um regime misto entre presidencialismo e parlamentarismo. Em tal seminário, Gilmar Mendes lembrou que a aprovação de dois impeachments pelo Congresso Nacional, sob a Constituição de 1988, já permitiu que alguns estudiosos do exterior falem em “parlamentarização do presidencialismo brasileiro”.
Em razão da cultura da escolha do primeiro dirigente da Nação, não haveria no Brasil como afastar a figura da eleição presidencial, diretamente pelo povo. Por outro lado, para aumentar a responsabilidade do Parlamento, este dividiria responsabilidades com o Presidente eleito, daí a possibilidade de se caminhar para um modelo híbrido, ou misto, denominado semipresidencialismo ou semiparlamentarismo.
É fato que o modelo atual tornou-se disfuncional, pois não consegue conciliar estabilidade com flexibilidade para o enfrentamento de problemas cruciais. No mínimo, há de haver uma reforma política para aprimorar o atual sistema.
Trata-se de um debate oportuno. A depender do andar das coisas num futuro próximo, a ideia de um regime político misto, combinando presidencialismo e parlamentarismo, tem mais perspectiva de futuro do que de passado.
*Adacir Reis é advogado e presidente do Instituto San Tiago Dantas de Direito e Economia